Vigésima
Já não é apenas suspeita que tenho queda para separações, especializada que sou em finais, com valência em precipícios e falésias. No encore desses fins, que foram removendo os plurais da vida, adelgaçando-lhe cada vez mais a cintura, o caminho da renovação, ainda que involuntária, acabou por me revelar mais larga afinal, numa inteireza desconhecida, que por vezes me levou por caminhos criativos inexplorados. A reviravolta que marcou o ano de 2018 brindou-me com um desses escapes acidentais, proposto por um fotógrafo que conheci na dança de rua, que encheria de cor e entusiasmo os anos vindouros.
O gosto pela arte, pelas contaminações da intertextualidade, a veia espiritual e o ímpeto a expressar uma sensualidade até aí abafada deram origem a um material que talvez se abeire do oxímoro, com uma certa ponta de escândalo para quem me conhecia tapada e posta em sossego. Não vesti personagens: provei facetas, percorrendo os diferentes prismas e escamas que a inspiração ia revelando do Feminino. Crendo-me fadada à invisibilidade, voz revolta e desavinda com a escrita, foi novidade descobrir-me parte da paisagem, cavar lugar no mundo às claras, apesar do esforço que o movimento de expansão e exposição pedia a quem antes preferia encolher-se, arrastar os olhos ao chão.
Cabe dizer que o meu amadorismo, uma certa limitação de recursos e a falta de habilidade para os artifícios da beleza tornaram a produção quase sempre pouco ambiciosa. Havia a inclinação natural para a simplicidade, que deu naturalmente mãos às circunstâncias, fazendo com que o material descartado ultrapassasse em muito o apurado, de que reuni uma seleção num portefólio entretanto fechado ao público, devido à qualidade da atenção que atraía. Reabro-o* num curto trecho de alguns dias, como forma de comemoração desta 20.ª sessão (ainda por editar), por terras de Nossa Senhora do Vau. Ao fotógrafo e amigo, Francisco Amaral, reafirmo a minha gratidão: porque me viu na multidão onde me sumia, e me deu a ver a quem pôde.
* Já fechado, entretanto.
**Especialmente dedicada à Câmara Municipal de Amarante, que não teve conhecimento da nossa presença e não emprega vigilantes para informar a população de que em espaços públicos só se pode tirar selfies.