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Na Pegada do Silêncio

" ‘You are a lover of silence’, he said". H. W. L. Poonja

" ‘You are a lover of silence’, he said". H. W. L. Poonja

Na Pegada do Silêncio

08
Mar25

"Thy name is woman"

Sónia Quental

 

Elegância é a arte de não se fazer notar, aliada ao cuidado subtil de se deixar distinguir.

Paul Valéry

 

 

         O movimento de diluição das diferenças de género que ganhou expressão nos últimos anos foi precedido nalgumas décadas por uma fação a dado ponto paralela, de redescoberta dessas mesmas diferenças, em que se baseiam muitas mentorias de relacionamento. É assim que hoje se vê uma afluência de coaches que vendem os segredos não só dos relacionamentos, mas do que é, em essência, a feminilidade e a masculinidade. A par da estreiteza de certas generalizações, a visão de cada um traduz, como não podia deixar de ser, a própria maturidade, fazendo circular novos estereótipos que refletem diferentes graus de miopia. Foi neste contexto que me deparei com o vídeo abaixo, em que uma coach desfila na rua, descrevendo-se como modelo de feminilidade e elegância. Consigo depreender porque é que os olhares se voltam para ela, mas deixo a interpretação a cada um.

         A pretexto deste vídeo e da efeméride, aproveito para expressar aquilo que não tenho como marca de feminilidade: feminilidade não é usar sapato de salto alto; não é pintar as unhas nem carregar a pele de maquilhagem; não é o menear de ancas que se vê aqui. Esta manhã, depois de ter sido recebida numa loja por uma pessoa que me desejou feliz Dia da Mulher com um sorriso treinado e uma voz estridente (daqueles votos que agradeço e não devolvo), fui atendida logo a seguir por outra que me ofereceu ajuda exalando uma feminilidade natural, apesar do excesso de peso e das calças de ganga que usava.

         Se em textos anteriores propus que a afirmação do feminino não passa pela exibição relaxada de deformidades, em nome da aceitação e protesto contra a ditadura de uma imagem social de beleza, ela também não reside na artificialidade decorativa nem na neurose. Conheci ao longo da vida várias mulheres deslumbrantes cuja insegurança as despia de toda a beleza. Conheço quem viva a contar calorias e só consiga usar leggings pretas, para que não se notem as imperfeições. A perfeição que conheço não é de vidro e não é tirana. Por agradável que tenha sido, a seguir à democracia dos jeans, redescobrir as saias e os vestidos, hoje sei que não é o vestido que faz a mulher, mas a mulher que faz o vestido.

         Depois de crescer num ambiente em que não se reconheciam diferenças entre o modo de ser masculino e o feminino – o que, em vez de aumentar a compreensão entre ambos os sexos, a dificultava – foi extremamente curativo redescobrir-me como mulher, mesmo que não me reveja na forma de estar da maioria das mulheres que me rodeiam. Nesse percurso, aprendi também que a maturidade de homens e mulheres os leva a conhecer e a dominar crescentemente, e de modo consciente, a polaridade oposta. No entanto, antes de aspirarmos à androginia, sugiro que comecemos por ser aquilo que a natureza nos fez.

 

 

Always a paradox. Always tangible, but also, somehow, elusive and just out of reach. Always present, and yet, somehow, removed, the true female seems for ever, strangely, inexplicably, a wonderful and unfathomable mystery!

Théun Mares

 

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Na Pegada do Silêncio by Sónia Quental is licensed under CC BY-NC-ND 4.0