Pintar a manta
Brincava há tempos com alguém em torno da praxe das conversas sobre o tempo como ritual de aproximação entre desconhecidos. É uma prática que passei a admirar e que produz em mim um certo fascínio como expediente com que se preenche silêncios incómodos e se alivia a sensação de separação ou de ameaça psicológica em contextos de vizinhança física.
Dizia Chesterton haver razões delicadas e profundas para se falar sobre o tempo: começando por evocar um movimento de adoração primitiva, na sua natureza de prece pagã, é também uma forma de reconhecimento da igualdade entre as pessoas, sendo motivo de fraternidade: “Toda a verdadeira amizade se inicia pelo lume, pela comida e pela bebida e pela opinião sobre a chuva ou a geada. Os que não começam pelo lado corpóreo das coisas são já pedantes (…)”.
Mas até essa prática inocente os “ativistas” pelo clima conseguiram contaminar, transformando as conversas sobre o tempo num ato de contrição, tingido pelo pesar circunspeto do luto, em que parece que expressamos continuamente uns aos outros os pêsames pelo falecimento de um parente comum.
A onda de entusiasmo e a publicidade dada ao tema das crianças índigo morreu na praia da realidade, agora que chegaram à adolescência e à idade adulta, aparentemente virgens de educação. Esses seres messiânicos, de aura azul, que vinham para mudar o mundo, estão a conseguir abanar com ele, mas no papel de kamikazes abezerrados, com o arco-íris estampado na roupa, cortes de cabelo duvidosos e a apetência pela cor expressa na tinta com que vandalizam propriedade alheia.
Não vieram para mudar o mundo, mas para pintar a manta e proferir pérolas de sabedoria que creem ausentes da literatura que não conhecem. A sua bagagem literária são as frases de inspiração das agendas (também coloridas) publicadas pelas feministas a tempo inteiro, que se ocupam de desconstruir os "tabus" da sociedade, com a ambição de se apropriarem quer do tempo meteorológico quer do cronológico.
Se se lembrassem da mitologia que conhecem pelo menos dos videojogos e dos filmes, seriam prudentes. Saberiam que são filhos de Cronos, não o contrário, e que o deus grego não era pai permissivo.