Também aqui é agosto
Todas as minhas fontes vêm de ti
Daniel Faria
Mulher sou, retenho líquidos. Nasci com os olhos tortos, voltados para dentro. Nem o médico da vista os endireitou. Nem as lentes de plástico vermelha e verde com que desenhava um risco no labirinto. Chamavam a um preguiçoso. Ele continuou sempre, sem ligar.
Espremo a pele para não guardar tanto líquido, dividi-lo com o mundo carente de águas.
Endireito os olhos fixando o horizonte em névoa, endireito o labirinto enquanto caminho. Bico de papagaio no joelho. Endireito o esqueleto.
Encho baldes de água. Por isso me esqueceram, criança, no tanque de lavar a roupa – para reter a água ainda limpa, fazer a distribuição na minha clínica imperfeição humana. A vida foi para aprender a pô-la a circular, sangue azul cada vez mais puro, olhos cada vez mais fechados para fora, salinas concentradas de claro fervor.
Pensava que me faltava o mar, mas também aqui é agosto.