42. Balanço de anca
As únicas coisas que posso ter como certas no aniversário são que vai estar de chuva e que haverá um qualquer alucinado a tentar saltar da caixa de Pandora, mostrando o quão fundo ela vai: o trabalho do esquecimento é uma odisseia cheia de remos.
Não trago listas com aprendizagens de vida, ocupada que estou a desaprender, bater de lado contra a ignorância. Posso contar as pancadas que já dei, enquanto anseio pela próxima e me desenredo da esperança, para não criar depósitos no fundo. Só a travessia do desespero leva às costas da Alegria.
Quem disse que o que sobrava era a esperança não quis ir longe. Eu quero, nem que seja de boia ou atada a um mastro. Quanto mais longe vou, menos as certezas, mais leve fico, descosida de sabedorias. A única coisa que balança é a anca, enquanto repito “sim, sim; não, não” e reduzo as palavras à essência, a um afago o silêncio.